segunda-feira, 15 de abril de 2013

DHARMA, UTILIDADE,KARMA E REENCARNAÇÃO

DHARMA, UTILIDADE, KARMA E REENCARNAÇÃO



Pode parecer paradoxal, mas este texto não pretende responder ou esclarecer qualquer coisa em relação aos temas que compõem o seu título, mas apenas demonstrar o seu caráter conceitual e histórico, para que o leitor possa meditar sobre o assunto.
Talvez o texto oriental que demonstre de forma mais clara e incisiva o conflito entre tais temas seja o Bhagavad Gita (Divina ou Sublime Canção, conforme a tradução).
O nosso panorama se revela quando Arjuna, aterrorizado por ter que enfrentar os seus parentes e amigos no campo de Kurukshetra, diz a Kirishna (um avatar ou encarnação divina), que não lutará e atira o seu arco ao chão.
Daí surge toda a questão, pois Arjuna nasceu um Kshatrya (classe dos guerreiros), daí decorrendo o seu dharma.
Como guerreiro, sua função é bater-se no campo de batalha, pois para isso foi preparado toda a sua vida, entretanto, quando se depara com a situação real, posto que teria que suprimir a vida daqueles a quem amava, questiona a validade de tudo aquilo.
Krishna, entretanto,o convence, fazendo-o ver a partir de seu dharma.
Vejam que o princípio em questão, liga-se ao sistema original de castas, pois se alguém já nasce com determinada função, deve cumpri-la.
A casta não diz o que o ente é, mas qual o seu dever, sua função e, portanto, ele deve realizá-lo com devoção, entrega, determinação e sapiência.
Arjuna era um guerreiro e para isso foi preparado, visto que esta é função (dharma) que lhe coube naquela existência.
Assim, cabe a cada qual exercer a sua função ao longo de sua existência, encontrando sua realização nela.
Nada do que tinha se passado na vida de Arjuna, até aquele momento tinha fim em si mesmo, senão para conduzi-lo ao campo de Kurushetra, onde ele iria viver o momento culminante da sua existência.
Entretanto, naquele momento surgiu o conflito.
Curiosamente, Arjuna se sentia realizado e útil até então, mas na verdade sua utilidade era ilusória, posto que ainda não travara as batalhas para as quais fora preparado.
Contudo, agora ele se recusava a ir à luta, e tudo por apegos e convenções sociais.
Foi naquele momento crucial que a verdade se revelou a Arjuna por meio de Krisnha, o seu Guru (dissipador das trevas) e condutor de seu carro.
Curiosamente, o momento em que o Ego se sente mais enfraquecido, se sente inútil e sem saída, é também quando, na maioria das vezes a verdade se revela.
Muitas vezes nos sentimos inúteis e procuramos refúgio em uma atividade paralela ao invés de por nos à nu diante de nós mesmos.
Domenico de Mais, no seu livro “O Ócio Criativo”, comenta o fato de que algumas pessoas dão empregos à jovens que se limitam a apertar botões dos andares do elevador, para lhes dar uma falsa noção de dignidade e de utilidade.
Tal questão se torna mais grave, quando a noção de utilidade que temos no ocidente nada tem a ver com a noção do Dharma vinda do oriente.
Enquanto o Dharma diz respeito à função íntima espiritual do ser, seu lugar no jogo cósmico da existência, a “utilidade” do ocidental se refere á importância da pessoa (escrevi pessoa de propósito) para o capital e meios de produção.
Sob a ótica do capital talvez Ramkrishna, Buda, Jesus, Ramana, Aurobindo, Krishamurthi e outros não teriam utilidade nenhuma, mas sob a ótica oriental do Dharma, ou seja, sua função no jogo cósmico, a resposta é outra.
Obviamente, o conceito de karma se liga ao de dharma, visto que o exercício da função faz girar as engrenagens cósmicas para o funcionamento de tudo quanto existe.
Karma nada tem a ver com punição, mas com o entrelaçamento das condutas de todos os entes que existem em todos os planos da existência e que, por isso, fazem girar a roda eterna da vida.
Com diz Ram Dass no seu livro “Caminhos para Deus”, é como a expansão da maré, das ondas e marolas, isso é o Karma e a expansão das águas a reencarnação.
Reencarnar é o nascer renascer da vida que é una e eterna.

7 comentários:

  1. Belíssimo texto, brilhante paralelo entre o Mahabharata e o De Massi!

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  2. O dharma não pode ser despertado, ele apenas é, quando o homem toma consciência da sua realidade, da sua real existência, ele compreende a sua função e atua conforme ela mesma. Não há como se tentar ter fome, ou despertar a fome. A natureza humana fará que ela se manifeste e você saberá que está com fome.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Realmente, quando o Ser percebe qual é sua função e a real importãncia dela, ele toma consciência de seu valor. De Masi adverte: que para sermos, de fato, donos do nosso destino, é preciso refletir sobre ele e isso só é possível com o ócio criativo. Certo de que o stress causado pelo excesso de trabalho e pela supervalorização dele só leva certeiramente a um destino mais rápido — a morte —, de Masi salienta que a beleza e o prazer da vida está, principalmente, em coisas simples.

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  5. Sob a ótica do yogue, o excesso de trabalho, assim como o consumismo e a busca do prazer estão no mesmo patamar: Fuga!

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