TEMAS
PARA OS SARVA-SWAMIS
I
Toda
crença, toda prática, tudo enfim, que existe neste mundo contém ilusão.
Veja
bem, a Vedanta diz que existem cinco formas de se ligar a Deus: Como Pai, Mãe,
Amigo, Filho ou Amante.
Sejamos
francos, nisso aí contém uma dose cavalar de ilusão.
A
força viva creadora e mantenedora não pode ser sua amante, mãe, pai, filho ou o
que o valha, porque estes valores são deste plano.
É
uma estratégia mental para atender suas necessidades.
Ramakrishna
diz em seu evangelho: A mãe tem um só peixe, mas o prepara de forma diversa a
fim de agradar o paladar de cada um de seus filhos, de modo que cada um pensa que degusta coisa diferente.
Não
se trata, pois, de ilusão?
Da
mesma forma, não é o próprio Mestre Sevananda, nosso primeiro Sarvayogacharya
quem diz que até no Samadhi existe ilusão?
Peço
reflexão para o seguinte exemplo:
Um
homem tem muitos filhos e durante a noite, no curso do sono, cada um tem um
sonho. Pela manhã o homem pergunta, a cada um, o que sonhou: Respostas: que era
um príncipe muito rico; que era um guerreiro e matei muitos homens; que tinha
muitas mulheres e vivia na boemia.
O
homem, então, severamente os pune pelos sonhos que tiveram. Manda que cada um,
ao dormir, corrija, em sonho, os erros que cometeram.
Qual
o sentido disso?
Da
mesma forma, um jovem passa um dia em frente ao vídeo game, jogando e vivendo
vários personagens. Ao final do dia é punido porque seus personagens cometeram
ações maléficas.
Qual
o sentido disso?
O
que está por trás disso?
Porque
a força creadora se incomodaria com tais coisas?
Se
tudo é ilusão, porque seremos punidos ela conduta ilusória/
Quem
morreu? Quem matou? Quem prevaricou? Ninguém, se tudo não passa de um sonho.
Koan
Zen:
“Antes de
praticar o zen, uma árvore era só uma árvore, um rio só um rio, e uma montanha
só uma montanha. Depois que comecei a praticar o zen, uma árvore não era apenas
uma árvore, um rio não era só um rio e uma montanha não era só uma montanha.
Quando compreendi o zen, uma árvore passou a ser só uma árvore, um rio só um
rio e uma montanha só uma montanha”
O
Zen é a consciência cotidiana.
Assim,
esta é a questão. O que realmente existe?
Quem
pode responder...
II
Você
é um Sarva-Swami. Você experimentou pelo menos um tipo de êxtase e foi capaz de
reiterá-lo, no entanto parece que nada mudou.
Ao
contrário, se mudou você deve estar imaginando que foi para pior.
Você
teve momentos maravilhosos, sentiu-se nas nuvens, um escolhido de Deus, mas e
agora?
Você
deveria ser pleno, talvez um Mestre, mas não se sente assim. O que aconteceu?
Quantas
vezes você já se viu como um herói, um cavaleiro, um monge, ou um santo?
Entretanto,
não é assim que você se sente hoje é?
Porque
você não é pleno?
Toda
imagem formulada no Ocidente a respeito de um iniciado tem um “quê” de
melodramático.
O
iniciado é alguém que se reúne, secretamente, (igual ao Batman, Robin,
Super-Homem, liga da Justiça Xmen, etc.), para combater o mal, proteger os
fracos, trazer a Luz, curar, consolar, e mais uma dúzia de milhar de coisas.
Afinal,
ele é um escolhido, alguém que tem o esclarecimento que os outros, neófitos,
que vivem nas trevas não têm.
Cabe
a você conduzi-los não é?
O
problema é que ninguém quer ser conduzido e, quando quer, te tratam como o
gênio da lâmpada (mil e uma utilidades não bastam).
Por
outro lado, você não anda nada feliz com a sua vida que não corresponde a
tríplice função:
- Sábio;
- Herói;
- Santo;
Não
é glamurosa a sua situação. Você continua precisando tomar ônibus, trabalhar,
levar os filhos para a escola e fazer todas aquelas coisas que o homem comum
faz.
E
aí?
È
que, na verdade, toda a sua idéia de iniciado sempre esteve fundada em estereótipos.
A
realidade é outra: O Zen é a
consciência cotidiana.
Isso
mesmo, sem glamour, sem heroísmos, sem melodramas, sem frases de efeito.
A
consciência do real é o dia a dia.
Você
deve contar com você, com o que está lá dentro.
O
tempo das vivências, de ser consolado, acabou. Agora você deve viver o
cotidiano. Uma árvore deve ser uma árvore, um rio um rio e uma montanha uma
montanha.
Entenda
isso.
Você
não é o herói de ninguém, nem o mestre de ninguém e nem está aqui para
santificar ninguém.
Você
deve estar desperto e isso é tudo.
Você
não deve nada a ninguém, mas ninguém, tampouco, te deve alguma coisa.
É
difícil conviver com a realidade de que você é apenas um ser humano como tantos
outros?
Seja como
todos, mas mantenha-se consciente.
Crenças,
fé, religião, regras, culpa, euforia, êxtases, tudo faz parte do incrível e
infindável das ilusões.
Você
se debate: E o que me foi prometido?
Mas
o que te foi prometido? E por quem? E quem poderia te assegurar algo?
Seja
vigilante consigo mesmo, não seja auto indulgente e nem alimente a
auto-piedade.
Você
acreditou naquilo que sua mente, seu corpo, seus instintos e emoções precisavam
para se sustentar.
Agora
você se sente só, abandonado, frente a frente com o NADA, o desconhecido.
É
isso, é o que lhe resta o NADA.
O
VAZIO.
Você
terá que enfrentar isso.
III
Você
já observou quanto do comportamento do dito “discípulo” se parece com o
comportamento Humano?
Quer
ser um mestre, um santo, um cavaleiro com uma missão sagrada (enfim quer salvar
o mundo). Infância: quer ser um cowboy, um policial,
um viajante espacial, etc..., quando crescer.
Se
revolta por não ser, ou não se enquadrar em nenhum dos ícones: Adolescência, rebeldia, aparentemente,
imotivada, acha que foi trapaceado e que alguém lhe deve algo. “Tudo começou
quando descobriu que Papai Noel não existe.”
Ainda
não entramos na maturidade espiritual, não sabemos como é.
É
hora de começarmos a amadurecer.
Não
podemos aguardar por guloseimas (vivências) ou por comendas e títulos
(adolescência), contra os quais nos rebelaremos.
Elas
não virão mais. Esse tempo acabou.
Dizem
que o satori é a intuição da
sabedoria transcendental, mas dentro do conceito zen de simplicidade sem floreios.
Comer
quando tem fome, dormir quando sente sono, beber quando com sede, tudo dentro
de um esquema de identificação das estações, de cada coisa em seu lugar, da aplicação
cotidiana.
Uma
transcendência que se firma da consciência da existência e na sua aplicação
cotidiana, de forma global, integral e íntegra, finalmente, completa.
Um
estado de alerta tranqüilo.
Contente
por estar ser.
Estar
alerta ao levantar e em tudo o que ocorrer até o seu recolhimento. Afinal, no
começo, há alguns anos, não foi tão somente isso que lhe foi pedido? Por que
você não se tornou um ser humano feliz com isso?
IV
“Buscai
primeiro o reino dos céus e as outras coisas vos serão acrescentadas.”
“O reino dos
céus está centro de vós”.
Está
passagem nos dá o que pensar não é?
Nossa
tarefa primeira é buscar o mencionado reino
dos céus.
Ninguém
sabe do que se trata, entretanto, sabemos que ele está dentro de cada um.
Logo,
não será externamente que o encontraremos, mas em nosso âmago.
Por
conseqüência, isso só depende de nós, ninguém mais pode nos dar o reino dos
céus. Ele está em nós.
Assim,
nosso compromisso primordial é conosco mesmo.
Daí
porque o “conhecimento de Si” é uma recomendação que se faz a todos há
milênios, mas quase nunca é observada.
Tudo
parte do Si, como pode ser observado. Nada está fora, exemplo: amar o próximo
como a Si.
IV
Entretanto,
o reino dos céus não deve ser o mesmo para todos, posto que “no
reino de meu pai tem muitas moradas”.
Segundo
a famosa citação bíblica, cada um teria o seu “apartamento” com características
próprias.
Todo
mundo identifica um a apartamento, mas todo mundo sabe o que a diferença de um
para o outro, entretanto, só na vida espiritual as pessoas insistem em
reproduzir padrões e se comparar a outrem.
O
resultado é o enredamento em mais uma forma ilusória.
Portanto
o reino dos céus, em uma visão individual, é o encontro de Si mesmo, a
manifestação real e não potencial do indivíduo.
Essa
manifestação, sem estardalhaços, se dá no cotidiano.
É
o zen, ou a consciência em sua plenitude.
Consciência,
nada mais é do que Ciência de Si mesmo
em concomitância com tudo.
Entretanto
persistimos em buscar respostas externas, fora do Si e nos afastamos de nós
mesmos.
Insistimos
em encontramos um salvador ou nos convertermos em um.
Enquanto
assim procedermos, continuaremos longe de nós mesmos.
Ramana
Maharishi: Não existe um mestre e nem um discípulo do meu ponto de vista,
mas existe um mestre e um discípulo do seu ponto de vista.
Vale
dizer, o “mestre” também está situado no mundo ilusório, logo, libertar-se da
ilusão implica em livrar-se da idéia de “mestre” ou “salvador”.
Por
que você precisa ser ensinado a ser você mesmo? Por que você precisa ser salvo?
Por que você precisa ou quer ser protegido?
V
A religião
organizada é um manto ilusório
O
que caracteriza a estrutura religiosa é similar ao dos organismos legais.
Trata-se
de um conjunto normativo organizado que mantém o órgão em questão.
Toda
norma tem um comando (ordem) e uma sanção (punição) para o seu cumprimento ou,
até, um benefício (sanção positiva) para o seu cumprimento.
A
religião, em regra, opera, enquanto sanção com a culpa.
Lembre-se,
culpa não é algo que a gente tem, mas algo que a gente sente.
Assim,
trata-se de uma intromissão na psique do outro.
Entretanto,
no caso da religião organizada, principalmente as que se dizem Cristãs, é
interessante que você seja, sempre, um infrator.
Um
infrator sente culpa e quem sente culpa não é livre e teme a punição. Quem teme
a punição quer ser salvo e quem quer ser salvo, precisa de um salvador ou
intercessor e aí entram as Igrejas como as grandes intercessoras no processo de
salvação.
Entretanto,
se não sinto culpa, e não preciso de salvação, sou livre e independente.
Isso
pode ser bom para mim, mas não para as estruturas organizadas, para os grandes
mecanismos. Torno-me uma ameaça.
Paradoxalmente,
esta foi á razão de uma determinada crucificação à cerca de dois mil anos
atrás.
VI
AS SEITAS
CRISTÃS, O CRISTO E O CRISTÃO
Por
mais estranho que possa parecer estas coisas andam muito distantes uma da
outra.
Desconheço
seitas mais sectárias do que as cristãs. São as mais arrogantes.
Presumem
que tem que se impor aos outros, que são únicos, escolhidos, que os demais
vivem nas trevas etc.
Presumem
a realidade absoluta de sua crença e do que interpretam. Normalmente são os
mais limitados.
Entretanto,
em sentido diametralmente oposto, o Cristo era libertário (por isso foi morto),
não dogmático e por várias vezes demonstrou a incompatibilidade das questões
espirituais com as questões sociais, mas não foi compreendido:
Meu reino
não é deste mundo.
Dê a César o
que é de César e a Deus o que é de Deus. (em seguida pagou o imposto)
No reino dos
céus não existem tais coisas. (referindo-se
ao casamento).
Em
outras circunstâncias, mostrou-se como homem e cidadão que era conhecer a
essência do direito daquela época, o que não se confunde com a questão
espiritual interna.
Tais
questões são circunstanciais, mas insistimos em torná-las absolutas.
O
Cristão, portanto não pode ser um mero freqüentador de Igrejas, um repetidor de
salmos e recitador de versículos, mas um libertário, alguém livre de espírito e
mente.
VII
Toda
a confusão advém de tal movimento ter surgido entre um povo que tem a noção de
exclusividade, de ser escolhido, extremamente dogmático e excludente por
natureza.
Os
religiosos, curiosamente, seguiram a conduta popular ao invés de trilhar o
caminho de seu suposto líder: Quem
quiser me seguir que tome a sua cruz e ande.
Preferiram,
antes, a sombra confortável e segura da religião organizada, repetindo os
ícones e padrões atacados pelo Cristo.
Não
buscaram o reino dos céus, continuaram a trafegar pela terra.
Sequer
tem noção do que venha a ser “outras
coisas”.
Certamente,
uma vez diante do reino dos céus, outras coisas a serem acrescentadas não podem
ser tomadas no sentido da materialidade.
Você
não tem se alimentado por todos estes anos, dormindo, se locomovido, habitado e
se relacionado? Certamente não será isso a ser acrescentado.
Se
o Filho do Homem não tinha onde reclinar a cabeça, o que lhe terá sido
acrescido?
O
poder de curar? Curar o que, um corpo ilusório? Fazer maravilhas no plano da
ilusão? Não pergunte. Esqueça. Promova a auto investigação. É tudo.
VIII
O
islamismo, em face da origem comum dos povos, segue a mesma conduta, mas
adaptada aos seus dogmas e ideologias.
IX
As
religiões orientais (budismo, hinduísmo, etc...) também tem um
multiplicidade de seitas, mas não seguem
o mesmo padrão doutrinário do ocidental. Não pretendem conversões, não se
julgam exclusivas e, em regra, não se apóiam em um único doutrinador, o que
dificulta a personalização.
Entretanto,
costumam pugnar pela falta de senso da realidade, excessos e arroubos
românticos, que induz o seguidor a viver num estado de ilusão constante.
Por
outro lado, a falta de um único salvador
favorece a multiplicação de gurus, cada
qual com a sua “verdadezinha”, gerando cultos e cultos à personalidade,
dependência e auto isolamento quanto ao cotidiano, ou seja, fuga.
X
O QUE RESTA
A NÓS
Não
nos resta nada para nos apoiar.
Espero
que você consiga antever a beleza e oportunidade desse momento.
A
nós, sarva-swamis, sarva-yogues, bramacharyas avançados, ou melhor, os sem
qualquer qualificação ou reconhecimento, só resta encontrar a realidade interna
e vive-la cotidianamente.
Aprofundar
no Si, sem perder o senso do todo.
Tudo é irreal,
mas tudo é real.
Tudo
é irreal se percebido pela personalidade, mas se o Si é real, tudo que dele faz
parte (as outras coisas) são reais também.
Sigamos
de forma segura, sem culpas, arrependimentos e sem pena de nós mesmos.
Ouça
o que diz Krisnamurthi em resposta a pergunta de David Bohn:
Mas e o que
faremos depois?
__ Viveremos!
Simples assim.
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